Não parece filme? Mete "Granularização" aí

Se você acha que a era digital resolveu todos os problemas do cinema, está enganado(a), em alguns aspectos os filmes de rolo superam visualmente e tecnicamente as mídias digitais, mas... Porquê?

"Eu sempre acreditei que se você quer tentar e fazer um filme grandioso, não apenas bom, mas sim, grandioso, você tem que correr muitos riscos" - Christopher Nolan, diretor de Inception, Interestelar, Trilogia Batman da Warner entre outros.

O cinema hoje é algo inimaginável décadas atrás, tanto na qualidade do conteúdo, quanto o tamanho da informação gerada por estes, um exemplo clássico foi o filme "Vingadores: Ultimato" que gerou uma quantidade monstruosa de dados. As possibilidades para criação de enredos que surgiram graças a evolução da tecnologia digital foram enormes. Se formos parar pra pensar, Matrix é de 1999, e alguns de seus efeitos especiais/coreografias são impressionantes até hoje.

Do ponto de vista da engenharia e dos sistemas multimídia, podemos dividir a evolução da produção de uma imagem, seu tratamento e exibição em algumas etapas. Falando especificamente de vídeo, nós temo dentro da captura, uma vasta história de evolução de câmeras, iluminação e construção de cenários. Da parte de câmera, não vou nem falar da evolução de câmeras de mão (hand-held cameras) para a popularicação de câmeras DSLR e até mesmo a evolução destas para câmeras melhores ainda nos smartphones, pois, se pararmos pra pensar, no início, a filmadora era manual, com uma "manivela", e não se podia revisar a gravação na hora, e cada cena custava muuuuuuito mais dinheiro só por conta dos custos do rolo de filme. Na parte de processamento do que foi gravado ou sua pós-produção, temos mais avanços ainda, pois precisamos lembrar de "O Enigma da Pirâmide" (Young Sherlock Holmes, 1985), onde tivemos pela primeira vez o uso de computação gráfica no cinema, e sim, naquela época não existia Blender, Maya, DaVinci, para criar os efeitos, os membros da equipe técnica calcularam toda a movimentação na mão, criaram equações, aplicaram cálculo numérico na cena, foi um marco.

Antes dessa cena, existia uma limitação muito grande nos "efeitos especiais", muitos deles sendo realizados com filtros de cor para esconder maquiagem e revelar em transições quase que perfeitas. A imaginação e a noção espacial também é muito importante nesse sentido, pois a forma como a cena do Neo desviando de balas foi filmada em Matrix é simplesmente incrível.

Poderíamos citar aqui efeitos incríveis, técnicas mirabolantes, o uso moderno de efeitos práticos (amém Nolan), impressões fotorealísticas de personagens (pegue o exemplo do Hulk e sua evolução, o Hulk de Ultimato parece mesmo o Mark Ruffalo)

Todas as técnicas de codificação, correção de erro para persistência e redundância do vídeo, utilizadas tanto na engenharia de vários sistemas quanto cinema, tudo isso não resolve um problema... Dar ao filme a cara de filme. Sim, aquela saturação específica, granulação, aquele destaque de cor específico que vai do menor para o maior dentro do espectro, o que muitos da área consideram melhor em filmes de rolo do que filmes digitais.

É claro que tentamos emular isso com aplicação de efeitos pós gravação, usando técnicas como "Range" dinâmico, correção de cor. E é claro que câmeras digitais são mais baratas que as antigas, porém, emular o efeito de "film" é muito difícil e sua artificialidade pode prejudicar o resultado final. Gênios da direção como Quentin Tarantino (Pulp Fiction, Bastardos Inglórios), David Fincher (Clube da Luta, A Rede Social), e o próprio Christopher Nolan (não tirando os méritos da equipe de produção), conseguem trazer essa sensação de "filme" para nós, o Nolan por exemplo grava 99% das suas cenas com câmeras de 24 quadros por segundo usando . Hoje já temos conteúdos produzidos em 8K, o que é incrível, cenas gravadas em 180 quadros por segundo, e tecnologicamente isso é incrível, porém, alguns diretores abusam demais desse tipo de tecnologia, e particularmente, eu não sou fã do Zack Snyder (300, Batman vs Superman) por conta disso, a imersão é totalmente perdida, parece tudo muito artificial e menos mágico. A iluminação é outro ponto que está aos poucos sendo resolvida, pois em vários músicos, a iluminação artificial mente muito na cena, mas a gente acredita, porém é muito artificial, ainda mais com as famosas telas verdes, para colocar os atores e atrizes em qualquer lugar, mas, com as telas gigantes de LED usadas na série "O Mandaloriano" esse problema pode vir a sumir totalmente.

Claro que existem exemplos maravilhosos de um uso majestoso e perfeito de técnicas de imersão e correção de cor em filmes digitais, como Blade Runner 2049, onde o mestre Roger Deakins, um dos maiores nomes da fotografia, fez um trabalho majestoso, sério, assista Blade Runner 2049, mesmo que você não seja fã do gênero, pois é uma experiência incrível. Inclusive, o fato de termos a maioria dos produtos de vídeo reproduzidos a 24 quadros por segundo, é algo histórico que ninguém pensou em quebrar o paradigma, para talvez evitar a perda maior ainda da experiência de um realismo imaginário? Pois veja só, videogames adoram 60 quadros por segundo, os "gamers" amam, pois 30 já não presta mais, porém, a diferença é essa, videogames foram feitos para serem assim, as cenas são velozes, muita informação na tela, muitas vezes a física real é ignorada, então faz sentido termos jogos rodando com essa capacidade, por mais que emular técnicas como "Ray tracing" em 60 fps seja muito difícil. Quem sabe algum dia todo mundo possua em casa televisores de 70 polegadas com tecnologia LED, pelo menos 4K por segundo, talvez as pessoas comecem a usar transmissões a 30 ou até 60 fps para filmes, comerciais, e outros produtos relacionados. Para isso, precisamos cada vez mais estudar e aprimorar as tecnologias de processamento e transmissão de imagem/som, algo que eu adoro e adoro (deve ser por isso que sou da Engenharia de Informação...).

Mais de 1000 palavras e eu tenho certeza que arranhei apenas a superfície do dilema Digital vs "Film", algo que o cinema está sempre buscando em melhorar, pois isso ajuda muito na experiência do consumidor, e muitas vezes cria marcos revolucionários na história do cinema, onde graças a estes, criadores eternalizam suas obras. Mais pra frente vou abordar a matemática por trás de todo processamento, armazenamento e transmissão de vídeo, ainda preciso fazer isso de uma forma amigável. Até mais